A trajetória de Márcia Kelly, gerente da UBS Vila Albertina, reflete os valores do SUS e espírito da SBCD: acolher, transformar e seguir sempre em frente com gente e para gente

Foi em Guaianases, no extremo da Zona Leste de São Paulo, que Márcia Kelly Araujo descobriu a possibilidade transformadora da saúde pública. E em dezembro de 2000, aos 18 anos, ela deu os primeiros passos como Agente Comunitária de Saúde (ACS) no projeto Qualis/PSF.
Conhecido como Projeto Qualidade Integral em Saúde, foi uma iniciativa pioneira do Estado de São Paulo em parceria com o Ministério da Saúde. O projeto visava a implantação da Estratégia Saúde da Família (ESF) no município de São Paulo, com foco inicial na zona leste da cidade.
“Ali tudo começou”, diz, com brilho nos olhos. E o contato direto com a comunidade mostrou que o SUS era muito mais do que exames e consultas: era escuta, presença e vínculo. Também foi nesse início que ouviu frases que levaria para a vida: “Não importa o que você vá estudar, o importante é acreditar que pode ir além”.
Márcia acreditou. E foi além.
Conquistas que nascem do esforço e da coletividade
Entretanto, mesmo sendo mãe solo de dois filhos pequenos, não deixou que o peso da rotina apagasse seus planos. Trabalhou como auxiliar de enfermagem por oito anos na Cidade Tiradentes. E mesmo entre plantões e responsabilidades, decidiu fazer faculdade. Enfrentou a graduação com apoio do FIES, e com ainda mais apoio de uma rede invisível, mas essencial: amigos que ofereciam caronas até a faculdade, colegas que dividiam marmitas para ajudar a economizar, familiares que cuidavam das crianças nos dias mais difíceis.
Assim, tornou-se a primeira da família a conquistar um diploma universitário. Inspirando irmãos, primos e colegas a acreditarem em seus próprios sonhos. “Nada disso seria possível sozinha”, afirma.
A partir disso, a formação abriu novas portas: trabalhou como enfermeira na Brasilândia, na Sé e na Penha, acumulando vivências distintas nas periferias e no centro da cidade. E em 2019, estreou na gestão, coordenando equipes de Estratégia Saúde da Família na região de Santana/Tucuruvi em meio à pandemia. Dois anos depois, assumiu a gerência da UBS Jardim Apuanã, onde conduziu a unidade até a certificação ONA, símbolo de qualidade e compromisso com a assistência.
Um novo capítulo: desafios e coragem na Vila Albertina
Já no final de 2024, surgiu um novo convite — e um novo desafio: assumir a gerência da UBS Vila Albertina, a maior unidade básica da região do Tremembé e referência para toda a Zona Norte. A unidade é uma das 17 administradas pela Sociedade Brasileira Caminho de Damasco (SBCD), em parceria com a Prefeitura de São Paulo e a Secretaria Municipal de Saúde.
Márcia aceitou. “Com medo mesmo”, admite, com honestidade. Mas foi. E, desde então, imprime ali a mesma energia que marcou toda a sua trajetória: acreditar nas pessoas, construir vínculos verdadeiros e transformar o serviço público a partir do cuidado com quem cuida.
E sua atuação está diretamente conectada aos novos valores institucionais da SBCD. Como por exemplo, a valorização de profissionais por meio do aperfeiçoamento e a crença de que “nosso caminho é feito de pessoas para atender pessoas”. Ou seja, com essa base, ela também lidera a manutenção da certificação ONA na unidade. Reafirmando o compromisso com a melhoria contínua.
“Acredite. Mesmo nos dias difíceis”
Hoje, aos 43 anos, mãe de Beatriz e Guilherme, Márcia olha para sua trajetória com orgulho e para o futuro com o mesmo entusiasmo de quem começou como ACS. “Ser gerente de uma UBS vai além da gestão. É garantir um ambiente de acolhimento, de escuta, de presença. É lembrar todos os dias que trabalhamos com gente. E gente precisa ser cuidada.”
Ao final, ela deixa uma mensagem para quem, como ela, já pensou em desistir no meio do caminho: “Vai ser difícil. Vai ter dia em que você vai pensar em parar. Mas continue. Porque estudar abre portas que a gente nem imagina. E porque ninguém conquista nada sozinho”.